quarta-feira, 26 de junho de 2024

A boa música nunca morre


 

80's ou 2000's?

 Nos anos 80, a música brasileira viveu um período de efervescência criativa, especialmente no rock, que se firmava como um movimento cultural robusto e inovador. Bandas como Legião Urbana, Titãs, Barão Vermelho, Paralamas do Sucesso e RPM capturaram a energia e a inquietação da juventude, criando canções que se tornaram hinos de uma geração. Essas bandas não só dominaram as paradas de sucesso, mas também refletiam um momento histórico de grande transformação política e social, com o fim da ditadura militar e a redemocratização do país.

O rock dos anos 80 no Brasil se destacou pela sua autenticidade e pelo compromisso com a experimentação sonora. Em um cenário onde a tecnologia começava a oferecer novos recursos, os artistas souberam incorporar sintetizadores e efeitos de guitarra sem perder a essência roqueira. As letras das músicas muitas vezes abordavam questões sociais, políticas e existenciais, ecoando as preocupações de uma geração que ansiava por liberdade e mudança.

A performance ao vivo e a estética visual também eram componentes cruciais do rock brasileiro dos anos 80. Bandas como Blitz e Ultraje a Rigor usavam o humor e a irreverência para conectar-se com o público, enquanto Legião Urbana oferecia uma profundidade lírica que ressoava profundamente com os jovens. A televisão, com programas como o “Cassino do Chacrinha” e “Fantástico”, foi um veículo poderoso para a disseminação desses novos sons e imagens.

Em contraste, a música popular brasileira atual é marcada por uma diversidade de estilos e pela influência massiva da produção digital. O sertanejo universitário, o funk carioca e o pop dominam as paradas, refletindo uma sociedade cada vez mais conectada e influenciada por tendências globais. Artistas como Anitta, Luan Santana e Marília Mendonça (in memoriam) exemplificam essa nova era, onde a produção polida e a presença nas redes sociais são tão importantes quanto o talento musical.

Enquanto o rock dos anos 80 era muitas vezes visto como uma forma de resistência cultural, desafiando normas estabelecidas e expressando uma busca por autenticidade, muitos críticos argumentam que a música atual pode ser excessivamente comercial. A produção musical contemporânea, facilitada por tecnologias digitais, tende a ser mais homogênea e focada em fórmulas de sucesso imediato, com refrões repetitivos e batidas cativantes. As letras, embora diversas, muitas vezes enfatizam temas de festa e romance, com menos foco em questões sociais e políticas.

No entanto, é importante reconhecer que a música atual também reflete as complexidades e diversidades da sociedade brasileira contemporânea. Movimentos como o funk ostentação e o rap de periferia dão voz a segmentos da população que antes eram marginalizados, utilizando a música como plataforma de expressão e denúncia social. Além disso, a facilidade de acesso e distribuição digital democratizou a produção musical, permitindo que novos talentos emergam e atinjam um público global.

Em última análise, a comparação entre o rock brasileiro dos anos 80 e os ritmos populares atuais revela tanto a evolução quanto a continuidade na cena musical do país. Enquanto a nostalgia pelo rock dos anos 80 destaca uma época de inovação e resistência cultural, a música atual, com sua diversidade e imediatismo, espelha uma sociedade em constante transformação. Cada era possui suas particularidades e contribuições únicas, compondo um panorama musical rico e multifacetado que continua a evoluir.

sábado, 22 de junho de 2024

É hora das lendas


 

a cruz e o caldeirão

é bem certo que conduzimos ao longo da

vida muitos cadáveres de nós próprios

(CASTRO, Ferreira de. A Selva.

Rio de Janeiro, Moura Fontes, 1934.) 


noite passada algo não me deixou dormir / a princípio, imaginei que fosse o gato, mas logo descartei tal hipótese, pois lembrei que ele se foi com as crianças / maldito acidente/

sem poder descansar, levantei e fui caminhar pela escuridão da noite, apesar de estar chovendo muito / calcei as botas que ganhei da bárbara no meu último aniversário com ela, acendi um cigarro e saí/

imagens desconexas tomam conta da minha cabeça: um carro, uma curva, três corpos inertes no asfalto e eu comprando os presentes de natal / inutilidades, futilidades, lembranças vãs que agora não passam de instrumentos de tortura / iron maiden/

voltei para casa e, ainda sem sono, abri uma garrafa de vinho, me embriaguei e caí dormindo / no dia seguinte, a casa toda cheirava a sexo (?), mas eu estava sozinho /

realidade, imaginação ou insanidade? a esta altura já não sei mais quem eu sou, nem se estou vivo ou morto / na verdade, preferiria estar morto, ao menos não ficaria mais sozinho/

passei a tarde toda largado no sofá da sala / não levantei nem para ir ao banheiro / controle remoto na mão, tv a cabo, filmes subnutridos intelectualmente, mulheres nuas anunciando o tele-sexo e um porta-retrato na estante expondo meu passado / uma lágrima vagueia pelo meu rosto e vai morrer afogada na taça de champanhe / tristeza não tem fim, felicidade sim/

outra noite sem dormir / os minutos custam a passar / dava-se, então, o êxodo, mais trágico e numeroso do que o dos antigos hebreus nos domínios da cristandade / a insanidade bate à minha porta e eu abro / ao menos alguém se lembra de mim, mesmo que seja para me enlouquecer e me levar de vez para junto dos meus/

escrevo estas memórias com o objetivo de me tornar alguém, nem que para isso tenha que morrer, pois nada é mais excitante que umas memórias póstumas / mas infelizmente isso não acontecerá, porque ninguém ao menos sabe que eu existo / não tenho parentes, vizinhos, nada / não tenho ninguém a quem transmitir o legado da minha miséria/

sou um ser solitário, sim, mas quem nunca passou por isso? quem nunca se sentiu um nada? quem, num momento de loucura, não pensou ser deus? todas essas interrogativas estão aí para fazê-lo pensar, caro leitor, no quanto nós, seres humanos, somos insignificantes perante a vida/

já se passaram dois anos do maldito acidente e ainda não consigo dormir uma noite inteira / continuo tendo os mesmos pesadelos, minha cabeça continua formulando as mesmas imagens desconexas: um carro, uma curva e três corpos inertes no asfalto / dois anos já se passaram e continuo sentindo aquele cheiro insuportável de sexo (?) pela casa, apesar de nunca mais ter conhecido ninguém que a substituísse/

bárbara...

dois anos já se passaram e a única coisa que ainda faço regularmente é sair de casa para ir trabalhar, mesmo que aquilo seja um martírio para mim / pessoas fúteis, q.i. 25, obsoletas/

bárbara... dois anos já se passaram e eu ainda estou aqui: trabalho, casa, álcool, fumo, alucinações...

dois anos já se passaram e a única palavra que eu consigo proferir é: saudade!

noite passada tive um pesadelo, quando acordei pensei que havia alguém em casa, na verdade era só a sua lembrança a me atormentar / deitei na cama, abri uma garrafa de licor, acendi um havana e cerrei os olhos / enquanto tragava e degustava o licor, outras imagens se formaram em minha mente: posto de joelho em terra, os meus olhos sôfregos tentaram enquadrar na sombra um corpo desnudado de uma mulher / um véu cobria seu rosto, ficando oculto todo o tempo, impedindo que eu desvendasse seu misterioso segredo/

cai a taça de licor / mancha no tapete / humo y ceniza pelo quarto / a faxineira não aparece há meses / disse que eu estava louco e que tinha medo de ser atacada, pois soube que eu andava falando sozinho e vendo coisas / idiota!

pobres daqueles que vivem a mesma rotina a vida toda/

maldito acidente/

andando pela rua à noite, tenho a sensação de estar sendo seguido e vigiado / aperto o passo / chove / vejo um carro, uma curva e três corpos inertes no asfalto / de súbito corro para socorrê-los / ao me aproximar, identifico-os: bárbara, meus dois filhos e, próximo à calçada, meu gato branco...

A boa música nunca morre


 

A boa música nunca morre




 

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