segunda-feira, 8 de março de 2010

RENASCIMENTO


naquele dia eu disse: esta noite será minha última noite / não que eu vá desaparecer, muito pelo contrário, vou aparecer como nunca houvera aparecido / quando ele chegar em casa estarei pronta para o amor, pronta para amar, mesmo que seja minha derradeira ação sobre a terra / tudo besteira, pois não foi a primeira vez que fiz tal promessa nem foi a última, já que, sempre ao fazer uma promessa algo mais forte do que eu me impedia de cumpri-la/ mas não foi o que aconteceu / quando ele chegou, ébrio e cheirando a perfume barato de putas analfabetas, não pude mais, simplesmente não pude mais / fui para o meu quarto, tirei o vestido preto de seda, desfiz o penteado, guardei as jóias, borrei a maquiagem e me coloquei, nua, frente ao espelho / por algum tempo fiquei me observando como se eu fora ele, e pensei: - por que, afinal, não me queres mais? será que já não tenho mais a beleza juvenil que o conquistou, o mesmo viço, a mesma energia, o mesmo fogo de outrora? será que já não mais inspiro descontroladas paixões? será que não mais correspondo àquele amor adolescente? não, definitivamente, não é verdade / com certeza ainda posso despertar todos esses sentimentos, mas, infelizmente, só ele não percebe / então, ainda nua, deitei-me na cama e comecei a percorrer, com minha mão, todo o meu corpo / comecei pelas pernas, passei às coxas, cheguei ao ventre, aproximei-me dos seios e ali me detive por alguns instantes, alisando-os, apalpando-os e imaginando serem minhas mãos as de um amante qualquer, que não quer nada senão me dar prazer e que, depois de findo o ato, sai para nunca mais voltar, o que não acontece há muito tempo / assim fiquei até que, tendo-os intumescidos, não esperei mais e desci minhas mãos até meu sexo / lá chegando, acariciei-me, primeiro vagarosamente, como se fora a primeira vez, depois com mais energia e sofreguidão até que, quase desmaiando de prazer, urrei, gritei, chorei e gozei, gozei como nunca, como sempre quisera haver gozado, senti-me plena, senti-me mulher / durante algum tempo permaneci assim: quieta, chorando o amor que nunca tive, o prazer que nunca senti, a alegria que nunca experimentei / então levantei (as pernas ainda trêmulas), fui até o espelho, uma vez mais me olhei, retoquei a maquiagem, refiz o penteado, recoloquei o vestido, me perfumei e disse a mim mesma: que vá para o inferno/ peguei minha bolsa, as chaves do carro e saí para renascer...

Um comentário:

  1. Muito empolgante o seu conto, Oscar. Realmente! Acho que é só uma mostra do que ainda pode vir, hein. Já imaginou? Temos um amigo cronista, agora só falta o contista. Adorei a inspiração!


    Beijos (maior chuva aqui)

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