terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

PÓ E OSSOS

cinco horas da madrugada, hoje / num sobressalto, acordo, ouvindo um clamor de clarins e um rufo acelerado de caixas de guerra / corro à janela, que defronta o palácio do governo.
exatamente assim estou me sentindo agora / madrugada, insônia (de novo!), batimento descompassado do meu coração em guerra, a janela iluminada pela brasa de um cigarro que passa do lado de fora e você ilustrando meus sonhos alucinados pela febre que me consome noite após noite /
acordo (apesar de já estar acordado) e vou me sentar na varanda do 27º andar do edifício onde moro, em uma cidade que não pára, a não ser para te ver passar tal qual anjo caído do paraíso em noite de lua cheia, onde lobos e corujas cantam para espantar o medo e a solidão causada pela lei do mais forte /
sem entender muito bem o que está acontecendo, olho para baixo e vejo répteis rastejantes em fila, como se estivessem esperando a vez de serem devorados por um dos mensageiros do apocalipse, que só espera pelo momento de vomitar pragas e destruição pelo mundo, tal qual pandora quando abriu aquela maldita caixa...
mas como sempre, você não dá a mínima para o que se passa do lado de fora de sua vida insignificante, medíocre, egoísta e sem graça / na verdade, você só quer dinheiro para gastar com sexo, drogas e futilidades que, de uma forma ou de outra, lhe dão prazer, um prazer que ninguém jamais conseguiu te dar /
cansado de tanta podridão, vou para a sala, pego um velho álbum de fotografias e começo a rever meu passado, sem me importar com as más recordações que vêm à minha mente / folheando estas páginas já amareladas e deterioradas pelo tempo, me dou conta de que um dia você fez parte da minha vida e que fomos felizes por alguns momentos, mesmo que eles tenham sido tão raros a ponto de eu simplesmente esquecê-los /
algumas horas se passam até que percebo que estou com aquela maldita febre novamente / corro até a cozinha, pego uma aspirina e a tomo com coca-cola para ver se faz efeito mais rápido / só o que consigo é provocar mais uma crise de úlcera que me destrói por dentro, como você /
volto para a varanda /
amanhece /
chove /
você está mais uma vez dormindo no banco em frente ao prédio esperando que, como sempre, eu desça para trazê-la para casa depois de haver vagado pelas ruas, sem destino, sem dinheiro e sem ter conseguido um segundo sequer de prazer /
tomo um banho, me arrumo, desço até a garagem, entro no carro e vou trabalhar /
no final da tarde, um bilhete na porta de entrada:
te amo!
penso:
mais cinco anos sozinho!

2 comentários:

  1. Cara, que viagem! Noite, lembranças, cidade, luzes, uma verdadeira catarse de emoções. Adorei o texto! Até Pandora ressurgiu das cinzas com a sua caixa pavorosa.
    Bela inspiração! Aposto que vinda num fim de noite, acompanhado pela insônia. Sim, pois de insônia entendo bem, e tem saído cada coisa, rsrsrs.

    Beijos, Oscar, ótima quinta pra você.

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  2. Ah, álbuns de fotografia...
    A pior merda que já inventaram.

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